Publicado em 19/12/04
As luzes das ruas não são somente, então, iminências do Natal, são sirenes!
Não há só renas, trenós e papais-noéis, há também cavalos, cães ferozes e irracionais, veículos a perseguir o cotidiano interminável, há soldados prontos contra o tudo e o nada!
As cercas, antigamente, eram balaústres, separavam-nos do amigo vizinho e despencavam chuchus, tomates, buxos e outras xepas!
Hoje, são cercas elétricas tentando inibir o mal, conter a desigualdade social, a revolta, a frustração.
As cadeiras, antes, sobre a calçada à hora do jornal televisivo, momento de pôr a conversa em dia, prosear novos “causos”, hoje cadeiras elétricas, cadeiras que punem homens “à espera de um milagre”!
Onde andam nossos amigos? A quem posso sorrir? Devo abraçar causas ou pessoas? “A mão que afaga é a mesma que apedreja”? Onde posso estacionar e não ser refém dos pseudoguardadores de veículos?
O que é violência? Quais as cores da violência? Qual o cheiro da violência?
Violência é guardar o seu veículo e não aceitarem moedas ínfimas?
Violência é tirar o racha na Getúlio?
Violência é não se cumprimentar no elevador do prédio?
Violência é abrir túmulos no cemitério?
Violência é não ceder o lugar ao idoso?
Violência é não poder namorar em lugares públicos?
Violência é pichar muros alheios?
Violência é fumar em restaurantes após as refeições?
Violência é curtir filmes, programas, músicas sobre violência?
Não percebo e não sei mais o que é violência, transformei-me em uma peça do universo da violência; não sei mais o que é viver sem violência!
Apenas sei onde não há violência, vou aos domingos pela manhã à igreja São Judas Tadeu, lá eu sorrio, eu oro, eu choro, eu canto, sim, até isso eu faço! Canto no grupo de canto Santa Cecília e lá encontro a Deus! Não quero pregar a paz, não sou Gandhi, não quero parecer demagogo, somente desejo que encontremos um alívio para tanta violência!
Na última quarta-feira, Cláudia Araújo, minha aluna no Colégio Seta, foi mais uma vítima da violência!
Cláudia era, na sala de aula, uma pessoa pensativa, silenciosa, reflexiva, sorria, às vezes, perguntava dúvidas esporadicamente e havia passado para a segunda fase da Fuvest, dezoito anos, uma vida pela frente!
Estou muito triste e revoltado, violentaram mais um sonho, violentaram mais um ser, violentaram o desejo de existir!
Aos pais, desejo-lhes força, principalmente, divina! Se precisarem, procurem-me na igreja São Judas Tadeu, lá se encontra a força!
Aos amigos, professores e conhecidos, desejo-lhes a reflexão, peço-lhes a prece e o bom senso!
À polícia, à lei, peço, o óbvio, a Justiça!
Ao criminoso, a quem vou denominar “seu criminoso”, não peço, nem desejo nada! O pronome “seu” já se apoderou de você, porque você, “seu criminoso”, é só seu mesmo, ninguém lhe quer, você “vive” num mundo somente seu, pois não sabe e, oxalá, nunca saberá o que é ninar uma criança, não sabe o cheiro da brisa, não conhece o barulho da chuva, desconhece o sabor de um beijo, ignora o cingir dos braços! Você, “seu criminoso”, é só seu, não me chame de “meu”, pois não o quero como amigo, não reze o “Pai nosso”, pois você não deve estar no meio de nós, você, “seu criminoso”, já sabe o que é sofrer só ou só sofrer! Desculpem-me pela revolta, mas eu só queria aprender ensinando! Que Deus a tenha, Cláudia Araújo!
SINUHE DANIEL PRETO
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